Alteridade a partir das margens: o olhar ‘alheio’ da criança em Isabela Figueiredo, Caderno de memórias coloniais e Dulce Maria Cardoso, O retorno
Resumo
A perspetiva de criança é um procedimento narrativo usado, muitas vezes, para articular críticas diversas. Por causa da sua proveniência das margens da sociedade na qual vive, o ponto de vista de uma criança que não tem os conhecimentos requeridos para avaliar corretamente uma situação, é ingénuo, inocente, etc. Isto tem um certo impacto sobre o leitor que normalmente está disposto a conceder um maior grau de credibilidade e veracidade às histórias contadas por crianças. Tanto Isabela Figueiredo em Caderno de memórias coloniais como Dulce Maria Cardoso em O retorno utilizam esta perspetiva da criança para descobrir com ironia gentil, humor às vezes sarcástico e não-compreensão evidente as atitudes racistas dos emigrantes portugueses em África nas vésperas do colapso do sonho imperial, assim como os difíceis princípios de uma vida nova na antiga metrópole depois do retorno de mais de meio milhão de colonos das antigas colónias africanas.
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