Náufragos em busca de porto seguro: os episódios de Licas e de Crotona no Satyricon de Petrónio
Resumo
Desejosos de escaparem ao ambiente opressivo da Graeca urbs, que domina a parte inicial do Satyricon de Petrónio, os jovens Encólpio e Gíton decidem aceitar o convite de Eumolpo para embarcar num navio que se preparava para zarpar, sendo apenas a bordo que compreenderam que a navio pertencia a Licas, pessoa de quem andavam precisamente a fugir. Desta forma, o microcosmos de laços e relações que se organiza à volta desta personagem e do seu poder em alto mar faz com que o barco de Licas funcione como um universo autocrático, com regras e lógicas próprias, as quais se verão revertidas pela experiência do naufrágio, que causará a morte ao poderoso Licas e abrirá — ao velho poeta Eumolpo e em especial aos jovens aventureiros que o acompanham — uma via nova de salvação, ao abrigo da existência fictícia que recriarão na cidade de Crotona. Com este estudo, pretende-se analisar a forma como a experiência de quase-morte do naufrágio vai inspirar uma reconfiguração da natureza dos anti-heróis, que é também uma oportunidade de redenção e de reinvenção pessoais, mas que acabará por precipitar nova catástrofe e talvez de novo a busca de uma saída salvadora.
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