Um coleccionador de milagres: a obra do Padre Conceição Vieira

  • Manuel Curado Universidade do Minho
Palavras-chave: Padre José António Conceição Vieira (1832-?), apocalipse, esoterismo português, magia, redenção, Sebastianismo

Resumo

O presente capítulo aborda a obra pouco conhecida de um polemista português do século XIX: o Padre José António Conceição Vieira. Nascido em Alcoutim no final de 1831, Conceição Vieira produziu uma obra literária anómala para o século de progresso em que viveu. O desencontro entre a religião tradicional e as alterações sociais promovidas pela ciência oitocentista fez com que o sacerdote algarvio defendesse posições ultraconservadoras, mesmo para os padrões da época. Os aspectos mais interessantes da sua obra manifestam-se na recuperação de documentos olvidados da história do esoterismo português e, sobretudo, na crítica a movimentos religiosos contemporâneos. São especialmente relevantes as leituras que fez dos mitos em torno do Sebastianismo, os ataques ao Espiritismo oitocentista e as muitas críticas que fez ao interesse popular pelo hipnotismo e por outros fenómenos da mente humana profunda. As obras que produziu causam espanto ainda hoje, seja pela rica informação erudita que as caracteriza, seja pela consciência atormentada que revelam. Como o mundo das antigas crenças mágicas parece não ter nada a ver com o novel mundo tecnocientífico que Oitocentos anunciou, a comunicação defende que o Padre Conceição Vieira representa o mal-estar dos intelectuais a respeito das representações da Salvação, esteja ela ligada a um apocalipse universal, a uma experiência pessoal anómala ou a uma futura felicidade civilizacional proporcionada por meios técnicos. Em nota mais positiva, defende-se em complemento que o conhecimento da tradição do esoterismo português é valioso (ou até mesmo imprescindível) para a compreensão do imaginário redentor.

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Publicado
2020-06-25